Foz do Iguaçú-PR e Ciudad Del Leste

Fazem já quase duas semanas que não publicamos nada no blog, ou por falta de internet ou por desorganização nossa. Mas confesso que pra mim, registrar ou contar o que estamos passando tem se imposto como uma necessidade tão urgente quanto comer, ir no banheiro ou jogar video-game (que saudades de Zelda! Sério…). Agora já estamos em Asunción no Paraguai, quase partindo em direção a Encarnación. Vou tentar lembrar o que aconteceu desde Cascavel:

Momentos antes de partirmos de Cascavel rumo a Foz do Iguaçú, um caminho de 140 km que pretendíamos percorrer em um só dia, tentávamos descobrir no google maps alguma informação sobre o relevo deste trecho, sem sucesso. Se houvessem serras ou subidas como houveram em todos os dias anteriores à nossa chegada em Cascavel, essa distância iria nos esgotar, mas não queríamos ter que dividir este trecho em dois dias de viagem. Quem concluiu que o caminho seria plano foi o Túlio (nosso anfitrião na cidade): “Todas as cidades a partir de Cascavel até Foz do Iguaçú recebem indenização pelo alagamento devido à construção da barragem na hidroelétrica de Itaipú”.

 

Affonso, Túlio e Fabrício na nossa despedida de Cascavel-PR

No caminho, mais um tanto de toda aquela paisagem que cansamos de ver ao longo de São Paulo inteiro e muito do Paraná: quilômetros de plantações de soja, eucalipto, pinho, e em menor escala milho. Eu ficava imaginando aquelas crianças do interior que quando vêem o mar pela primeira vez tem uma sensação de imensidão, de infinito, e como eu tinha quase a mesma sensação ao olhar os campos de soja ou plantações de eucalipto, a perder de vista, mas sem o deslumbre da criança, e sim com a angústia de quem vê as evidências da ganância pelo lucro como uma forma de miséria. Não era muito diferente, pra mim, do que estar diante de um deserto (com todo respeito aos desertos, que tô cheio de vontade de conhecer).

Campo de soja entre Cascavel e Foz do Iguaçú

A foto ficou ruim, mas na propaganda uma mão segura uma semente de soja, que é igual a muita grana.

Durante a pedalada pelo estado do Paraná, os inúmeros rios (alguns muito, muito bonitos), as araucárias, um grande trecho onde a cada quilômetro havia uma olaria emanando cheiro de tijolo queimado pelas chaminés, e também as serras, tudo isso dava um respiro e outro ritmo pra o cenário repetitivo que se revezava entre soja, eucalipto e pinho. Quanto mais perto chegávamos de Foz, mais esse cenário era invadido por cartazes (outdoors) realmente enooormes anunciando lojas ou produtos a venda no Paraguai.

Anúncio da loja paraguaia Monalisa, constante em todo o estado do Paraná.

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Um episódio solto, que aconteceu poucas horas antes de chegarmos em Foz: fazia muito calor, e o Fatício me esperava na sombra de uma árvore a poucos metros de um posto de gasolina onde reporíamos nossa água. Uns 15 metros antes da sombra, sentada na estrada no exato ponto onde passam os pneus direitos dos carros e ônibus sobre o asfalto estava sentada uma pomba, parada e quieta, parecia que chocava um nada. Eu passei a pomba, cheguei na sombra e comentei com o Fatício: “Olha a suicida lá”. Nem 10 segundos depois veio o caminhão e só ouvi um “ploc” que queria poder apagar da cabeça. O Fatício viu e comentou: “É, pegou mesmo”. Nem virei o rosto e seguimos pro posto. O Fatício voltou a falar: “Cara, que estranho!”. Ficamos com isso na cabeça até que um frentista, muito sorridente e animado, chegou perguntando: “Posso saber de que ponto do planeta vocês são?”

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Nessa viagem muita coisa ganha aquele frescor dos cheiros na infância, como o cheiro de pão quentinho que vem te acordar na cama de manhã. Mesmo o cheiro de chiqueiro, quando passava um caminhão com dois andares lotados de porcos berrando loucamente, ou de um animal morto na beira da estrada, tudo isso estranhamente tem me devolvido essa sensação de frescor. E eu, que já não tenho mais avós vivos, tive de volta a sensação de um acolhimento de vó nos 5 dias que passamos em Foz, na casa da Cida Muriana, parente distante e até há pouco tempo desconhecida do Fabrício. Mesmo comendo mais de 2 quilos por dia durante as pedaladas (que eu nunca soube pra onde vão), na Cida me senti naquele típico regime de engorda em casa de vó (uma avó jovem, diga-se de passagem).

Cida Muriana, logo após nossa chegada. Reparem e lembrem desse tipo de cadeira, falarei dela no post sobre o Paraguai.

E o Fatício, recém apresentado à Cida, e ainda suado pela viagem.

Logo que chegamos, muito cansados mas rindo à toa, a Cida já nos trouxe copo d´água geladinha, depois achocolatado, depois fez a janta, depois sorvete, e foi assim todo dia, mesmo com o Fatício, a Juli e eu insistindo em dividir as tarefas e os gastos. E toda essa comida e amor davam e sobravam pra nós quatro, mais a Jú e o João (filha da Cida e seu marido), o Xande e seus três filhos (Luiza, Xandinho e Angelo), o Lucas, o Pedro, e quem mais morasse ou frequentasse a casa da Cida.

No primeiro dia após nossa chegada (e da Juli, que nos acompanhou de Cascavel a Foz de ônibus) fomos conhecer a usina de Itaipu, ou mais propriamente, Itaipu Binacional (é tanto brasileira quanto paraguaia, ainda que menos de 10% da produção de energia seja destinada ao Paraguai). É, junto com as Cataratas do Iguaçú e Ciudad del Leste, um dos três lugares absolutamente assombrosos da região. A Juli escreveu um texto que publicamos aqui chamado “dois barbudos no templo do capitalismo” que fala muito bem sobre Itaipú, e eu queria mesmo que o Fatício também falasse algo, que ele é muito observador das questões políticas, econômicas, e de todo o custo humano envolvido na construção e manutenção da usina. Fala Fatício, faz favor!!

No segundo dia fomos conhecer o lado argentino das Cataratas do Iguazú. Eu já havia visitado duas vezes as Cataratas, até então apenas pelo lado brasileiro. Na primeira vez em que fui, um dia de muito sol e com as quedas de água especialmente volumosas, tive uma das experiências sensoriais mais intensas que já viví: chegando na ponta da passarela de metal que vai em direção à queda da Garganta do Diabo, era uma imensidão de água caindo, e aquele volume todo fazia o rio que corria sob a passarela formar inúmeros redemoinhos na superfície da água, e também redemoinhos de vapor ou gotas muito finas que se precipitavam pra fora da água em turbilhões; eu via arcos-íris em todo canto onde olhava, até um bambolê de arco-íris ao redor de mim, aquilo tudo parecia um enorme e truculento berçário de arco-íris; era água que te molhava de cima pra baixo, de baixo pra cima, de quatro, de lado, por trás…e quando olhei pra cima vi uma enorme esfera branca flutuando a poucos metros do início das quedas, toda de vapor de água condensada e rodando lentamente, parecia um planeta em branco. Tudo isso junto era um exagero de beleza concentrada, e nenhuma foto nem vídeo chegaria perto de expressar o que vi ou que pode acontecer por lá.

O lado argentino é sem dúvida muito mais bem estruturado, amplo e abrangente do que o brasileiro. É um enorme parque, no mínimo 10 vezes maior em espaço, variedade de opções de passeio e visões das Cataratas do que o lado brasileiro. E não posso deixar de falar do enorme fluxo turístico nos dois parques, um frenesi constante que, se bobear, também te contagia. Já falei muito das quedas, vejam algumas fotos e não deixem de conhecer quando puderem:

Juli esperando pra pegar o barco que leva até a ilha entre algumas quedas

 

Xande, Fatício e Juli no barco

 

Cida Muriana sobre a queda da Garganta do Diabo

A Garganta do Diabo vista de cima

Acordamos umas 8:00 no terceiro dia pra atravessarmos a Ponte da Amizade que liga Foz do Iguaçú à segunda maior cidade paraguaia, Ciudad del Leste. Como pretendíamos fazer algumas compras por lá, tivemos que esperar as casas de câmbio abrirem pra trocarmos reais por dólares.

Fatício e Juli observam o Rio Paraná através da cerca aberta na Ponte da Amizade

Tampouco seria minha primeira vez em Ciudad del Leste, mas não canso de ficar assombrado com a agressividade do comércio patente em todo canto da cidade; é o capitalismo na sua forma mais crua, sem terno nem etiqueta. Eu já estava mais ou menos avisado sobre o clima de velho-oeste no Paraguai, mas não deixei de me assustar com os seguranças particulares armados com escopetas ou metralhadoras nas portas de lojas e até de restaurantes. Nem com os vendedores de rua, homens, mulheres, velhos ou crianças, te assediando em massa com as mesmas estratégias de corrupção: “Camisinhas musicales, 5 reais…3 reais…1 real…Cocaína, haxixe?…”. Dentro de muitas lojas, um canal de televisão local exibe permanentemente e ao vivo um ângulo fixo da ponte da amizade, pra que os comerciantes avaliem como está o “clima” nas aduanas. A atmosfera real de malandragem, de mutreta, nos fazia tentar conter a histeria das compras pela extrema cautela de quem não quer ser sacaneado ou assaltado nem na rua nem nas lojas pelos vendedores, mas mesmo assim quase não pudemos evitar mais de uma situação que poderia ter nos dado muito prejuízo.

Juli compra meias

 

 

Interior de loja em Ciudad del Leste

Conhecer certas cidades através de moradores com conhecimentos específicos pode te propiciar uma profundidade de contato que você nunca poderia ter sozinho. Passei por isso na segunda vez em que visitei Brasília, quando tive o privilégio de conhecer outros aspectos da cidade através da mãe de uma amiga de lá, que trabalhava no Congresso e fez 3 faculdades: arquitetura, ciências políticas e gestão pública. Mesmo sem ter me convencido a gostar de Brasília, eu não poderia ter tido anfitriã melhor pra me apresentar os meandros daquela cidade. O mesmo aconteceu com o João, marido da Jú (filha da Cida), que mora em Foz e trabalha em Ciudad del Leste numa importadora. Foi ele quem nos deu os contatos de lojas nas quais poderíamos confiar, e a quantidade de dicas, macetes, informações que pegamos dele é incalculável. Invejo o Fatício por ter podido ir uma outra vez a Ciudad del Leste de moto na garupa do João: acho que andar de moto no trânsito realmente caótico e sem leis de lá, cruzando as fronteiras por corredores estreitíssimos e super concorridos, e mesmo com todo o risco envolvido, é uma das experiências mais intensas e específicas de lá. E fiquei pasmo com o João quando, ligando pela primeira vez o iPod que comprei e ao ver que estava todo escrito em chinês, ele soube trocar, às cegas e depois de uns 15 minutos mexendo no aparelho, o idioma padrão pra português.

Juli, Fatício, Juliana, Cida e Affonso na nossa partida de Foz do Iguaçú

Após os 5 dias de muito turismo, compras, família e descanso em Foz, novamente nos preparamos pra despedida, da Cida e sua família, e também mais um “até breve” pra Juli, que após uma semana nos acompanhando voltava pra São Paulo.

 

2 opiniões sobre “Foz do Iguaçú-PR e Ciudad Del Leste

  1. Paulo Trevisan disse:

    Uau, que coisa bacana essa exeriência lá nas cataratas: redemoinhos, vapores, “berçario de arco-íris” e aquele globo de vapor!!! uau!!! Sorte na trajetória e alegrias on the road! abç

  2. LARA disse:

    Olá! Gostei muitooo do seu blog, as fotos e a história contada me deixaram curiosa p/ conhecer um pouquinho sobre o Sul do nosso país. Agora, também penso em ir p/ Cascavel e Foz… =D
    Gostaria de saber se podemos manter contato por e-mail. Pois queria ter uma ideia de preço de hoteis mais baratos, ou albergues se possível.

    Desde já, obrigada!
    E parabéns pela aventura!!! \o/

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